sábado, 29 de agosto de 2009

O Boi



Essa aconteceu no tempo do meu biso, seu Joaquim, que foi testemunha ocular e auditiva do tal acontecido.

Mas vamos começar do começo.

O seu Toninho acordou atrasado, pegou três pamonhas, um pedaço de rapadura e foi comendo pelo caminho até na roça, onde ia colher batata.

Trabalhava um tempinho e bebia um copo de café, que o amigo, seu João, tinha levado.

– Ara, sô! Café mai doce!

– Recrama, mai ta bebeno né, cumpadi!

– Num tem ôto, uai.

E assim seguiu a manhã toda, até chegar a hora do almoço, quando os dos foram tomar suas refeições perto de um barranco.

Seu João comeu arroz, feijão, frango assado e salada de couve. Seu Toninho, que gostava de uma comida forte, mandou pro bucho uma dobradinha, batata doce afogada, macarrão e ovo frito... Tudo com bastante farinha de milho.

– O cumpadi ta firme na bóia hoje né?!

– Ô! Tem que cumê bem,sô. Saco vazio num pára em pé!

Depois que terminaram de comer, ficaram de papo pro ar, só olhando a paisagem. Perceberam, então, que tinha um belo dum boi pastando ali perto. Ficaram observando o bicho, até que seu Toninho levantou-se, foi até uma moita para dar sossego pra barriga que num parava de chiar.

Um tempinho depois, ouviu-se um barulhão. O boi tomou um susto, caiu barranco abaixo, quebrou o pescoço e... Essa foi a primeira vez que um peido rendeu um churrasco daqueles!

domingo, 23 de agosto de 2009

"Rec-rec-rec-rec tuuum!" Parte 2



O padre entrou e fez-se um instante solene de expectativa... Que logo foi interrompido pelo próprio padre saindo correndo pela porta, tropeçando na batina e beijando o chão.

– Seu padre! Pelo amor de Deus, que que tem lá dentro? – Perguntou dona Lúcia.

– Padre, o sinhô ta branco! Que foi que o sinhô viu lá dentro? – Indagou seu Chico.

– Um bicho. – Respondeu o padre. – Um bicho cabeludo.

– Credo! – Todos, em uníssono.

– Um bicho cabeludo, que correu atrás de mim.

– Mas deu pra vê que bicho que era? – Perguntou dona Lúcia, arregalando os olhos, enquanto via dona Maria, a dona da casa, chegando do serviço, espantada com o tumulto na porta de sua residência.

– Num vi, minha fia, tava escuro...

– Ara! Que que tá aconteceno aqui? – Quis saber dona Maria.

– Tem um bicho cabeludo na tua casa cumadi! – Exclamou dona Lúcia. – E correu atrás do padre!

– Bicho cabeludo? Pêra já!

– Cumadi?!

Dona Maria passou por cima de todos e entrou na casa de supetão. Podia-se ouvir:

– Ara! Coisa feia! Que que ocê tá fazeno aí, Xandoca?! Ô Zé! Zé cadê ocê? – Dona Maria saiu na porta. – Argum doceis viu o Zé?

Ninguém entendeu. Parecia uma procissão de gente com cara de tonto.

– Cumadi Maria, ocê num fico com medo da assombração?

– Ara, Lúcia! Que assombração o quê...?

– Que gritêro que é esse Maria? – Chegou seu Zé esbravejando.

– Que gritêro que é esse?! É ocê impiastro de ômi! Cume que ocê me larga a tramela da porta do chiquero aberta?

– Quê?

– É! A Xandoca tá lá dendicasa, patinano no chão encerado. Num consegue andá, patina, patina e cai. “Rec-rec-rec-rec tuuum!”.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

"Rec-rec-rec-rec tuuum!"



– Lata dágua na cabeeeeeeçaaaaaaa... Lá vai Mariiiiia – Cantava dona Lúcia enquanto passava a enceradeira pelo imenso assoalho da casa grande. O chão ficou com tanto brilho que dava até pra palitar os dentes olhando nele. Quando terminou tudo, passou a chave na porta da sala e saiu pela cozinha. Tinha de ir à venda do seu Tonico, comprar mistura pra janta. Esquecida como ela só, dona Lúcia deixou a porta da cozinha aberta...

Algum tempinho depois ela voltou, colocou a chave na fechadura da porta da sala, deu a primeira volta e ouviu: “Rec-rec-rec-rec-rec tuuum!” Deu mais uma volta na chave, agora com a porta destrancada, pegou na maçaneta para abri-la e: “Rec-rec-rec-rec tuuum, rec-rec-rec tuuum!”

– Credo em cruiz! Que que é isso? Só pode sê assombração! Óia que baruio! Eu que num vo entrá aí dentro! – E saiu correndo. Logo voltou com seu Chico a tira colo.

– Óia Chico, que baruio!

E ouvia-se: “Rec-rec-rec-rec-rec... Rec-rec-rec tuuum!”

– Lúcia! Que que é isso fia? Só pode se coisa do ôto mundo! Jandira, corre aqui vem vê muié! – Gritou ele, para esposa que sondava de longe.

Mais uma vez puderam ouvir: “Rec-rec tuuum... Rec-rec-rec-rec-rec tuuum.”

Jandira benzeu-se, horrorizada – Deus me livre! Que que é isso? Chico! Vai chamá o padre!

E seu Chico foi chamar o padre. Enquanto eles não voltavam, foi uma sessão de “rec-rec-rec-rec-rec tuuum”, alguma exclamação e horror das mulheres e mais um “rec-rec-rec-rec-rec tuuum”.

O padre, enfim, chegou até lá e, intrigado, pediu silêncio para analisar a situação e ouvir direito o som: “Rec-rec-rec-rec-rec tuuum”.

– Eu vou entrar. – Disse o padre.

– Não seu padre! E se fô o coisa ruim? – indagou dona Lúcia.

– Deixe de besteira minha filha... Vou entrar.

E entrou. (CONTINUA...)

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A Mulher de Branco - Final



– Que foi Aparecida? – perguntou a mãe vendo-a chegar esbaforida em casa – Cê ta branca! Que que aconteceu?

– Ai mãe! A muié de branco correu atrás de nóis!

– Que jeito minha fia? De nóis quem?

– De mim e dum homem que tava lá na rua da delegacia.

– Ara!

– É verdade mãe.

– Mas ocê viu ela fia?

– Vê eu num vi, mas ela tava correno atrás de nóis. Eu escutei quando o homem gritou e saiu num carrerão. Aí eu aí correno tamém. Ele tava mais na minha frente e ia atrás. Eu até pedi pra ele me esperar porque eu tava com medo, mas ele tava com mais medo ainda... Corria, corria e nem queis me esperar.

– Virge... Mas o que ocê tava fazendo lá na rua Aparecida?

– Eu tinha ido busca uns gainho de erva doce pra fazer um chá pra senhora mãe. Lá no terreiro de frente pra delegacia tem uns pé de erva doce. Eu tava lá panhano um tando e a hora que eu levantei de trás do muro, escutei o homem gritano e saí correno tamém.

– Sei... Vai falano...

– Eu tava com xale da senhora no pescoço, mas na hora de panhá erva doce, tava arrastano pro chão, aí eu enrolei na cabeça... Eu até machuquei meu pé porque meu chinelo rebento e eu tive que ir descalça, com esse frio.

– Aparecida...

– Senhora?!

– Óia no espelho, fia

Quando Aparecida olhou-se no espelho, viu a camisola branca, o xale branco e a sua cara de assustada virou um riso só.

– Virge, mãe... A muié de branco era eu!

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

A Mulher de Branco



– É claro que é verdade! – Exclamou Tião, quase pondo os bofes pra fora – Eu to até branco, com as pernas bambas! Eu tava subindo a ladeira da delegacia, eram umas onze horas da noite, tava frio e não tinha ninguém na rua. Aí, quando eu tava passando bem em frente à delegacia, eu vi, saindo detrás da mureta do terreiro do outro lado da rua. Era a visão do inferno! Magra, encurvada, com um véu branco envolvendo a cabeça e descalça.

– E aí Tião? Que que o cê fez?

– Eu? Eu corri! – Como se fosse preciso perguntar, pois, tratando-se do Tião... Ele corre até da própria sombra. – Corri e gritei, “A Mulher de Branco!!!”. Corri mais que as pernas e, quando dei uma olhada pra trás...

– O quê?

– Num é que ela tava correndo atrás de mim?! Eu corria e gritava, ela corria atrás e gritava pra eu esperar.

– E o cê esperou?

– E eu sou besta? Eu ia esperar a assombração pra ela me pegar e...

– E...?

– E... Ah sei lá o quê. Num sei o que que assombração faz com a gente, mas num deve de ser bão.

– Ta, mas continua o causo!

– Quando eu tava passando pela encruzilhada que desce pra rua da igreja, ela sumiu!

– Sumiu?

– Sumiu... Nem sinal dela. Daí eu entrei em casa, rezei um terço e agora eu to aqui, contando tudo proceis.

E Tião contou no bar, na padaria, no açougue... Contou pro leiteiro, pro pedreiro e pro pipoqueiro e logo a história espalhou-se pela cidadezinha toda... (Continua)

sábado, 8 de agosto de 2009

Os Três Conselhos - Fim



No outro dia, passando em frente a uma propriedade, João percebeu que havia uma moça amarrada em um poste e um guarda ao lado. Ficou indignado e já ia perguntando o motivo de aquela moça estar ali presa daquele jeito, mas ponderou e lembrou-se do segundo conselho: “ Você não tem nada com a vida de ninguém”. Resolveu, então, acatar o conselho e não perguntar nada.

Assim, o guarda indagou-lhe:

- Não vai querer saber por que esta donzela está presa ali?

- Não.

- Não mesmo? – Insistiu.

- Não. – Disse João novamente.

Imediatamente o guarda pegou uma faca e cortou as cordas que atavam a moça, libertando-a. João não entendeu nada. A moça abraçou-o e explicou-lhe que o dono daquela propriedade era um excêntrico e sádico e que, toda vez que alguém questionava o motivo de alguma moça estar presa lá, ele as matava, mas se, por acaso, uma pessoa não demonstrasse interessa, as moças eram libertas.

O guarda ofereceu-lhe pouso, mas João preferiu seguir viagem – nunca se sabe o que pode acontecer à noite na casa de um excêntrico e sádico.

Seguiu mais algumas horas que pareciam as mais longas e pesadas de toda a viagem, mas, finalmente, avistou o casebre na penumbra do anoitecer. Estava um pouco diferente do que costumava ser. Parecia um pouco maior e mais novo. Havia um jardim e uma horta e uma vaca e as janelas estavam pintadas de azul! Ah! Que prazer era volta pra casa. Como o até o cheiro do ar das redondezas era diferente!

Chegou até a porta e resolveu espiar pelo buraco da fechadura antes de entrar. Pôde observar em um canto um homem e uma mulher, no outro canto, sentada em um sofá, viu Maria e havia um rapaz muito bem aparentado deitado em seu colo, enquanto ela afagava seus cabelos.

João foi tomado de uma ira feroz e crescente! Sacou sua cartucheira e decidiu entrar e acabar com a vida da ingrata da mulher que não conseguiu sequer esperá-lo e já caiu nos braços de outro enquanto ele esforçava-se para dar-lhes o sustento. Ah! Não podia ter feito isso, Maria.

Ia abrindo a porta quando lembrou-se do terceiro conselho: “ Pense três vezes antes de tomar uma atitude”. Assim, olhou de novo pela fechadura e viu sua esposa beijando o rosto do rapaz. Desconcertou-se, não tinha jeito. Agora ia matá-los, tinha de defender sua honra, lavá-la com o sangue da mulher adúltera e do safado que a roubara dele. Mas ponderou e olhou novamente pela fechadura. Viu o rapaz levantando-se, estendendo a mão para Maria e dizendo:

- Sua benção, minha mãe! Vou indo dormir.

João, envergonhado, lembrou-se, então, do filho que deixara no ventre de Maria quando seguiu viagem. Com os olhos vermelhos de choro, abriu a porta e a alegria foi imensa! Seus filhos mais velhos receberam-no com muito amor, assim como sua sempre fiel esposa. Abraçou seu filho mais moço e pediu perdão por não ter acompanhado sua criação.

Passaram a noite contando histórias, conhecendo-se de novo, achegando-se uns aos outros novamente. Nesse momento, João lembrou-se do pão. Devia cortá-lo apenas quando estivesse muito feliz, então o partiu. Tamanha foi a surpresa quando viram que o bendito pão estava recheado não de queijo, ou torresmo, mas de dinheiro, mas muito dinheiro. Bem mais do que a quantia que receberia se tivesse feito o acerto com o patrão da maneira convencional. Mas o mais importante ali não era o dinheiro, mas a felicidade e a lealdade daquela família.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Os Três Conselhos - Parte 3

Desculpem a demora para postar, mas eu ando tão atarefado que não ando tendo tempo de usar o computador, sem falar do monopólio da minha irmã. Mas tá aí, a terceira parte do conto Os Três Conselhos:



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Os Três Conselhos - Parte 3







O patrão, seu Davi, insistiu um pouco para que João ficasse por ali, mas não teve jeito. João estava decidido a ir embora e reencontrar sua família. Então o patrão levou-o ao escritório para fazer o acerto. Chegando lá, disse-lhe:

- João, eu filho, eu posso te dar muito dinheiro nos seus direitos, pois você trabalhou muito tempo aqui comigo. Mas quero saber uma coisa. Você gostaria de receber o seu pagamento em dinheiro mesmo?

- E tem outra forma?

- Eu gostaria muito de pagar-lhe com conselhos.

João pensou muito e, sem saber o motivo, aceitou o estranho pagamento em conselhos. Seu Davi disse, então:

- Eu tenho três conselhos para você.

O primeiro: “Nunca desvie de seu caminho”

O segundo: “Você não tem nada com vida de ninguém”

O terceiro: “Pense sempre três vezes antes tomar uma atitude”

Depois dos conselhos, o patrão entregou-lhe um pão caseiro, bem grande, enrolado em uma toalha e disse:

- João, você só deve cortar este pão quando estiver em um momento muito feliz, mas feliz de verdade. Agora, você pode pegar suas coisas e seguir seu caminho. Vá em paz.

João juntou suas tralhas, pegou o pão, e ficou matutando... “ Acho que endoidei. Não é possível! Eu poderia ter saído daqui com um bom dinheiro, mas tenho um pão e três frases bem estranhas”. Pensando assim, João tomou seu rumo e foi estrada a diante, seguindo pelo caminho que tinha usado para chegar até a fazenda, mas dessa vez ele não ia a pé, pois tinha comprado um cavalo com o pouco de dinheiro que guardava com ele todo mês.

Pelo caminho, João encontrou um outro viajante, conversaram e passaram a rumar juntos. Mais a diante, havia uma bifurcação. João sabia que tinha vindo pela esquerda, mas o viajante insistia para que fossem pela direita, pois tinha certeza de que o caminho era mais curto, assim economizariam seis horas de viagem. Pedro foi seguindo o viajante, mas lembrou-se do primeiro conselho: “Nunca desvie de seu caminho”. Pensou e acabou desistindo de ir por ali e foi mesmo pela esquerda, onde tinha certeza que chegaria, não importando o tempo gasto. O viajante o chamou de burro e foi pela direita.

Quando João chegou ao vilarejo mais próximo, ouviu conversas sobre um bando de salteadores que andavam por aquelas bandas e que já tinham assassinado um viajante e roubado todas as suas coisas e seu cavalo. Ouvindo essas coisas, ele imediatamente agradeceu o ex-patrão em pensamento pelo conselho. Ele pernoitou em uma pousada pobrezinha. De manhã, tomou café e seguiu viagem... (CONTINUA)



terça-feira, 4 de agosto de 2009

Os Três Conselhos



Parte 2



Fazia três dias que seu João estava na estrada. Estava fraco, faminto e debilitado. Foi revigorante quando avistou uma porteira e uma placa de madeira onde podia-se ler “Fazenda Maravilha”. Ele abriu a grande porteira e entrou; foi seguindo um trilho que levava até uma casa bem aparentada. Chegando lá foi recebido por Fausta, a cozinheira, que trabalhava para a família de longa data, bem antes de estabelecerem-se ali.

João contou a ela sua história enquanto comia um belo prato de arroz-feijão e frango frito. Fausta serviu-lhe um café forte e pediu que aguardasse um pouco, pois seu patrão ainda não havia chegado da cidade.

Seu Davi, o patrão, grande fazendeiro, um dos mais ricos da região, costumava ir à cidade pra tratar de negócios quase todos os dias. Saia pela manhã e voltava no crepúsculo.

Faltavam alguns minutos para as sete da noite quando seu Davi chegou. Fausta avisou-lhe do forasteiro que aguardava na cozinha. Seu Davi pediu para que fosse chamá-lo.

Quando João o viu, somente pelo seu olhar, conseguiu sentir-se aliviado. Davi era velho, cabelos acinzentados, porte europeu, todo posudo, mas seus olhos... O brilho dos seus olhos demonstrava grande jovialidade e inspiravam muita afeição. Ouviu com atenção a tudo que João dissera e prontamente deu-lhe o emprego.

João ordenhava as vacas que serviam para o abastecimento da própria fazenda, alimentava as galinhas, os patos e os porcos. Cuidava da horta, fazia alguns consertos na propriedade e estava sempre a disposição do patrão.

Quando dona Maria recebeu a primeira carta com notícias do marido, ficou imensamente feliz. Sentiu-se também aliviada quando contou as cédulas que eram grande parte do salário de João; o dinheiro dava pra pagar as contas e comprar comida.

Passaram-se alguns meses. Um ano. Dois anos. Dezoito anos. João afeiçoou-se tanto ao patrão, aos outros empregados e à própria fazenda que acabou ficando por lá sem notar o tempo passar. Sentia saudades da família, mas dizia para si mesmo que tudo era para o bem deles. Nunca deixou de enviar-lhes notícias e o dinheirinho para as necessidades do mês. Mas certa manhã, a saudade bateu tão forte que quase o derrubou. João quis voltar, precisava voltar. Assim, foi ter com o patrão para avisar-lhe da decisão... (CONTINUA)

domingo, 2 de agosto de 2009

Conto



Os Três Conselhos - Parte 1



Pela janela de madeira rústica, que estava escancarada, pois fazia muito calor naquela época, podia-se ver dona Maria, uma senhora; embora fosse jovem... Senhora porque casara há alguns anos com João e essa união já lhes rendera dois filhos; um belo casal, diga-se de passagem. Estavam reunidos na cozinha, que era o cômodo mais freqüentado dos três que constituíam o casebre. Maria preparava algo no fogão de lenha, naquela panela preta de fuligem e gasta pelo tempo.

Na hora de comer, uma oração em agradecimento pela vida, o amém e um olhar fosco, engolindo a seco do seu João, que não podia mais ver seus filhos comendo água e farinha. Hoje era mais forte o sentimento de apatia, pois recebera a notícia de que mais um bacurizinho estava a caminho. Dona Maria estava grávida de pouco tempo.

Durante a noite, ele não pôde dormir, pensando em como alimentaria mais um filho. Quando o sol deu o ar de sua graça, pela manhã bem cedo, foi cortar lenha na mata, perto de casa, e aproveitou para passar na vila e ouvir as novas do povo de lá. Ficou sabendo de um fazendeiro, muito rico, que havia se estabelecido no distrito, que ficava um pouco longe dali, e precisava de trabalhadores.

Quando chegou em casa, após mais um jantar que feria seu orgulho, novamente não pôde dormir, mas agora pensando na notícia de emprego que recebera. Não se conteve e passou a contar para Maria suas intenções. Ele realmente queria ir pro distrito e tentar um emprego na fazenda do novo ricasso da região. Ele mandaria dinheiro para a família todo mês, mas, para isso, teria de ficar longe deles, por muito tempo.

Foi uma sessão de lágrimas, mas foi-lhe concedido fazer de tal modo. Em sua despedida, mais uma sessão de lágrimas, depois, seu João seguiu seu caminho pela estrada em diante... (CONTINUA)

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